quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Crônica - Um dia de folga

Foi bem num dia de folga do emprego para compensar o plantão de fim de semana. Quarta-feira, véspera da Primavera, tempo bom e o sol se anunciando assanhado. Leila acordou às seis, como de hábito. Preparou o café das crianças e amoleceu no microondas o pão sobrado de dois dias atrás.

Previu um dia cheio. A bacia de plástico cheia de roupas a serem esfregadas estava ali, exposta e inadiável. Na pia, pratos, copos, talheres e canecas pediam água. No chão da cozinha ciscos: pão, bolacha, grão de arroz e caroço de azeitona encaravam a mulher como se perguntassem: “Quando a senhora vai nos recolher?”

Até a revisão final dos outros cômodos da casa foram-se minutos preciosos. Um paninho para tirar o pó dali, camas para arrumar, toalha para trocar e as cortinas, desalinhadas, pedindo acertos.

De volta à área de serviço, Leila ligou o radinho de pilha que, sob sol ou chuva, fica encostado no beiral da janela, do lado de dentro do apartamento, esperando para ser escutado. Cansada das vozes dos locutores de FM, que não falam, gritam e inventam modas vencidas, a mulher mudou o seletor para as AMs.

E então, horário eleitoral gratuito. Foi sair o som e alguém prometeu: “Para os torcedores, estádios de futebol cobertos...” Outro contou que há quinze anos entra na lista de um tal de diap. Um terceiro repetiu a mesma coisa. Alguém falou em mudar o estatuto da criança. E todo mundo tapou o sol com a peneira. Isso é frase de narrador de futebol dos anos 70.

Leila desligou o radinho, esfregou, varreu, passou, enxugou, transpirou, cozinhou, arrumou, ajeitou e nem teve tempo para um descanso no sofá. Terminou o dia de folga exausta, mas com uma possibilidade: ela, que não freqüenta estádio de futebol, espera que aquele vizinho mala, o mesmo que durante os jogos de futebol de seu time soca a parede, sai na janela para falar besteira e grita o tempo todo terá cobertura quando for ao campo.

Uma pesquisa mostra Tiririca na frente no Estado de São Paulo. E daí? São tantos tiriricas disputando vagas nas assembléias legislativas, câmara dos deputados, senado, governos de estados e presidência. Tudo em minúsculo, com o devido respeito à democracia deste país.

Mas Leila, a trabalhadora que compensou o plantão de sábado e domingo com uma folga, tem critério: ela não vota em candidato de cara lavada. E sobra alguém, minha senhora?

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