Trabalhador não almoça. Come alguma coisa. E por culpa de um defeito no fogão, bem onde se aperta o botãozinho que dá chama para acender a boca, a lingüiça não pode ser fritada para entrar na marmita. Foi por isso que aquele ali trouxe hoje apenas feijão e arroz.
O complemento veio de um bar logo adiante. Pastel de carne, quentinho, com a massa borbulhada de um lado e estatelada de outro. Quase branca, sinal de que faltou fritura. Grossa e sem crocante, pesada, eternamente mastigável feito um chiclete ou uma bala de goma.
A carne era um bolo só. Não ficava soltinha dentro da encapadura de farinha de trigo. Uma pelota sem muito tempero e gosto duvidável. Nem cebolinha de cheiro se via em algum lugar.
Num canto do canteiro de obras, onde sobravam alguns tijolos, improvisou-se uma sala de refeições a céu aberto e sem mesa, longe de árvores que pudessem atrair pássaros deselegantes e prontos para as suas necessidades quem quer que esteja abaixo.
Comia-se de colher. Onde achar espaço para garfo e faca numa mesa tão desconfortável, as coxas das pernas? A primeira colherada, de arroz e feijão esquentado num fogareiro precário feito de restos de construção e acionado por gravetos recolhidos sem critério, esquentou o céu da boca, ardeu no dente cariado, arrastou na garganta e desceu, quebrando o impacto da fome.
Depois o pastel. Colocado de pé, a gordura desceu e respingou quando aquilo foi retirado do embrulho. Gotejou na calça ercardida e na primeira mordida estourou e fez o vento preso entre as massas fazer um pum. Emagreceu, fazendo a capa ficar mais mole.
Caiu no estômago e provocou azia. Foi uma tarde de queimação e desconforto. À noitinha, no caminho de volta para casa, o trabalhador comprou uma caixa de fósforo para dar chama à boca do fogão a gás.
Há 3 anos
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