terça-feira, 29 de junho de 2010

Crônica - A voz do outro lado

Desconfio que os recrutadores escolhiam aquelas profissional não somente pela fluência verbal, mas também pela voz. Trabalhavam normalmente em uma salinha fechada. Ninguém de outro setor tinha acesso ao recinto profissional delas. Na entrada ou na saída do expediente, elas geravam comentários:

- Aquela é a moça da voz macia. Olha ela ali, registrando o cartão de ponto.

- Nossa, eu pensei que ela fosse gorda e de mais idade. É uma menina...

As telefonistas de antigamente eram, sim, uma incógnita. Fala pausada, pronúncia correta, um jeito de sempre estar em dia com a paz. Enfrentavam com calma as ligações de clientes e colegas da própria empresa enfurecidos por qualquer motivo e dispostos a descontar a raiva no primeiro que atendesse o telefone. E não usavam gerúndio, do tipo:

- Senhor, vou estar transferindo a sua ligação para o setor competente e o senhor estará sendo atendido imediatamente.

Olha só, elas não usavam gerúndio como fazem hoje em dia alguns profissionais de telemarketing. Isso já era dez, então imagina o resto.

Mantinha-se uma espécie de manto sobre essas profissionais. A solicitude às vezes arrancava ironias de mau gosto de algumas colegas mulheres:

- Imagina, se ela fala assim com todo homem não se sabe o que acontece dentro daquela sala.

Maldade da grossa. Era educação, era cultura, era formação. Na verdade, naqueles tempos não só as telefonistas, mas também a mais simples das auxiliares sabia conversar com os colegas como uma pessoa culta. Se havia cultura, tinha-se como ser culta.

E as telefonistas, principalmente, tornavam-se peças fundamentais da equipe de trabalho. Eu lembro da dona Cida, que se aposentou telefonista. Conhecia todos os setores da empresa em que trabalhava, era colega, era parceira, era solidária. Foi e sempre será uma excelente telefonista, onde quer que esteja. Parabéns pelo 29 de junho.

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