Oito meses em Brasília no ano de 2004 me colocaram em contato direito com um mundo que eu desconhecia aqui na minha terrinha roxa, Londrina. Fui para lá sem emprego, num ônibus que trazia sacoleiros do Paraguai, passava por Maringá, apanhava passageiros em Londrina e seguia pela Rodovia Transbrasiliana até a Capital da República.
São cerca de 1200 quilômetros. Na época, o trecho da Transbrasiliana entre Lins, no Estado de São Paulo, e Goiânia, lá em Goíás, era tomado por enormes crateras. O ônibus da empresa Expresso Nacional seguia lento, balançando passageiros que suavam com o calor e enfrentavam durante a maior parte do percurso o cheiro insuportável do banheiro.
A demora, por culpa também das paradas em praticamente todos os postos das polícias rodoviárias federais e estaduais - passava-se pelo Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Goiás e finalmente Brasília - era de, no mínimo, 18 horas de viagem.
Lembro que, numa madrugada, a parada num posto policial me proporcionou uma cena interessante. Checavam todas as bagagens do ônibus e entravam com as lanternas acesas apontadas para os rostos dos passageiros. É que a maioria dos viajantes traziam produtos do Paraguai para serem vendidos em Goiás e em Brasília, no camelódromo montado bem embaixo do prédio da Secretaria da Receita Federal. Estranho isso, não acham? Este prédio é uma das pontas da chamada Esplanada dos Ministérios, que leva ao Congresso nacional e ao Palácio do Lula.
Depois da lanterna na cara e da verificação das bagagens, sobe o motorista e pergunta de quem é a sacola tal. Desce o dono, que demora lá fora meia hora e retorna, entre satisfeito e inconformado. O que será que houve lá fora? Pergunto se foi acerto e ele não me responde. Apenas me sorri, amarelo.
Em Brasília, produzi muitos projetos de comunicação para shoppings, condomínios médicos e políticos. Um dia desci a pé o prédio do Anexo IV, onde ficam os gabinetes dos deputados. Passei de porta em porta pedindo uma chance de trabalhar.
Nas empresas de comunicação levei currículos mas não consegui passar da portaria. Nem cheguei a conversar com recepcionistas, pois o próprio funcionário do portão se responsabilizava de entregar o documento ao recursos humanos.
Ah, sim. Consegui conversar com um deputado, que me solicitou a elaboração de um projeto específico de comunicação para ele. As negociações seriam feitas via assessor. Com o projeto pronto, visitei por quatro vezes o intermediário, sem sucesso.
Um dia alguém de lá mesmo me disse que eu estava perdendo tempo. Paulista, aquele conhecido que estava lotado no gabinete de um senador me disse que tudo em Brasília funciona na base da influência. Para conseguir um emprego, recorra a uma autoridade, que vai ligar para a direção de uma empresa. Para acertar um contrato de um projeto, não só use de influência, mas saiba negociar colocando no orçamento 20 por cento para lá, 10 por cento para cá e assim por diante.
Retornei a Londrina oito meses depois. Talvez eu me sinta culpado. Será que fui eu quem trouxe de lá essa coisa pegajosa de se empregar somente amigos, protegidos, apadrinhados e etecetera? A coisa aqui também está muita preta.
E viva o Dunga, prefeito de algum lugar.
Há 3 anos
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